Ainda me lembro daquele frio Novembro, e era nele a cidade de Lisboa, que com a sua inconfundível luz branca, subtilmente dispersa, onde dispersava eu a imensidão do meu pensamento. Caminhava para o castelo tão recto e orientado sobre si mesmo no topo da colina. Todas as ruas eram um labirinto de casas e de pessoas, cabendo em cada uma história, que por ser profusamente vivida, não descrita, se tornava particularmente especial. A rua que sobe desde o miradouro de São Vicente de Fora, perto da Igreja dos Cavaleiros da Ordem de Malta é particularmente representativa disto que vos conto. Mas ainda era naquela tarde solarenga que o sol se escondia por entre os azulejos portugueses e as pesadas ramagens verdes das árvores e as pessoas recorriam à sua rotina sobradjacente às necessidades desse mesmo quotidiano. De modo particular, lembro-me de uma lua estampada entre o Tejo e a cidade; branca, tão imóvel, tão fria como um gesso, magnífica fora a sua presença que de entre todas as presenças esta era a certa para preservar em minha memória o significado da tarde. Percorri as estreitas ruas até que encontrei o castelo preservado como um elemento integral da cidade, mas tão imenso que parece ser a cidade o elemento integral da sua estrutura. Creio que após viver estes anos em Lisboa, a resposta a esta questão põe-se-me ridícula e desnecessária - e se querem que admita, não tem muito a haver para o caso. E bem que entrei numa casa perto do castelo e virei-me de costas encontrei um moço de cuja figura não me posso esquecer.
Alto, moreno, olhos claros, trazia - apesar do ar frio do doce Novembro - uma camisa de cavas. Então, como um capricho do destino, o tempo parou, afunilou-se, alongou-se e, simultaneamente, tornou-se leve e simples. Tão simples que bastou um olhar comum para que houvesse, ainda que com efemeridade, algo ali. E ele continuou a olhar e eu continuei a olhar esqueci-me de grande parte do que aconteceu nesse dia, pela ordinariedade do quotidiano. Mas isto decorrido, não pude esquecer.
Mas a família esperava, aguardava a minha presença, eu não podia, não queria ir, ele detinha-se. Que sentido, que desgraça! Esta tragédia que é o espaço vivo do meu coração.
Queria trazer algo palpável, a liberdade talvez. Hoje o que vos conto é o pedaço desses segundos da minha vida que aconteceram perto do Castelo da preciosa cidade de Lisboa. E, ainda hoje, quando passo o dito local, o meu coração, o olhar aceleram-se e escorrem-se para esse espaço. 'Porque sou como uma onda no mar, o céu azul infinito ninguém me pode prender'. Que doce Novembro, em que a Lua ia baixa sobre o Tejo e os pinheiros balançavam sua dança milenar de milhares de vozes prometendo essa tão esperada liberdade.
1 comentário:
Ah malandro, eu bem sei que tipo de monumento andaste a apreciar lol. Gostei do texto :).
Enviar um comentário